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sexta-feira, 17 de junho de 2011

Crítica sobre Ser TÃO Ser

Estórias à margem da cidade-rio
Daniela Landin

Os ajudantes da empresa de mudança precisam de espaço para trabalhar, manter o caminho livre; deixar almoço ou lanche pronto, pois haverá demora; avisar no serviço que vai faltar no dia da mudança, solicitar o atestado à assistente social. Essas são algumas das orientações presentes no comunicado enviado pela Secretaria da Habitação e do Desenvolvimento Urbano, da Prefeitura de São Paulo, a moradores que vivem em locais não permitidos. Dessa forma, sem nenhum tipo de consulta popular, o poder público, muitas vezes amparado pela truculência policial, encaminha toda uma comunidade a albergues, para que depois seja alojada em conjuntos habitacionais localizados em regiões completamente desprovidas de serviços básicos, como luz, água, saneamento, saúde. Realidades como essa fizeram parte de um processo de criação do grupo Buraco d'Oráculo que teve como foco as questões em torno da moradia de pessoas que habitam favelas, ocupações de espaços abandonados e Cohabs. O espetáculo apresenta situações e narrativas costuradas a partir de um olhar para as possibilidades e os entraves da mobilização.
Um cortejo lento, quase melancólico, caminha pela Praça Mauá, no centro da cidade de Santos, e pára em determinado ponto, onde diversas pessoas do público se reúnem, formando um pequeno círculo. A parada é para a partilha de canções, café e histórias, numa relação de proximidade entre público e atores. As narrativas são apresentadas por uma voz feminina e outra masculina, enunciando as especificidades de ambos os universos em um contexto rural e nordestino. O cortejo prossegue para outras paragens até chegar em terreno a ser inventado, em busca de uma vida mais digna na cidade grande.
Ser TÃO ser – narrativas da outra margem traz a beleza e a amargura dessas histórias de idas e vindas, de sujeitos deslocados, que, assim como os artistas populares, vivem sob o signo do percurso, das travessias. O espetáculo contribui para a construção de uma outra perspectiva da própria história de São Paulo, das condições de vida nos extremos da zona leste paulistana, das lutas dos movimentos de moradia popular, mas também da reclusão, das periferias e de tantas outras margens – rio afora.

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